Para dar vida à casa de seus sonhos, a jornalista Giuliana Capello – que assina este texto - se lançou em uma grande experiência de bioconstrução. Seguindo o lema ″consumo consciente e simplicidade voluntária″, não faltaram soluções de máximo respeito pela natureza
Quando decidi deixar a cidade grande e me mudar para uma ecovila (pequena comunidade focada na preocupação com o meio ambiente e em uma convivência social harmoniosa) no interior de São Paulo, me perguntei: que tipo de lar pode refletir os meus ideais de uma vida em sintonia com o planeta? Em vez de priorizar linhas arquitetônicas, optei pelo prazer de fazer a minha própria morada, tal como um joão-de-barro (Contei detalhes dessa jornada no blog Gaiatos e Gaianos que escrevo desde 2007 para o Planeta Sustentável). O conceito do projeto, de 150 m², nasceu com a ajuda da arquiteta Lara Freitas, que orientou a montagem da estrutura de eucalipto de reflorestamento, além da construção da fundação e da cobertura. Com esse esqueleto em pé, abracei o desafio de levantar as paredes de vedação aos poucos, em mutirões com amigos e vizinhos. Usamos diversos materiais e técnicas debioconstrução: toquinho, adobe, tijolo ecológico, pedra e outros. Também implementei sistemas de captação e tratamento de água, telhado verde... E lá se foram cinco anos de obra! Tempo demais? Penso que mais importante do que ver a casa pronta foi participar desse processo.
Com esta técnica de construção de paredes, chamada cordwood, foi possível aproveitar sobras da madeira usada na estrutura, evitando a geração de entulho. - As toras foram serradas com 25 cm de comprimento, o que determinou a espessura da divisória. Os diâmetros diferentes garantiram um visual bem orgânico. - A massa leva três partes de terra argilosa, uma de areia, uma de cal, uma de serragem, fermentada em água por sete dias, e uma terça parte de cimento. Para a finalização, adiciona-se água até chegar à consistência de argila de modelar. - O assentamento pede paciência: a cada 70 cm, é preciso esperar a secagem total da massa.
UMA BOA DOSE DE RECICLAGEM, OUTRA DE AFETO
Materiais de demolição estão por todos os lados: é o caso do piso de peroba do quarto, que ganhei de um amigo, bem como de portas, janelas e absolutamente todos os vidros; as aberturas das paredes foram determinadas pelo formato das placas que consegui garimpar em depósitos. - Na cozinha, uma ideia de reaproveitamento conta um pouco da história da construção da casa: os módulos de madeira que apoiam os porta-temperos (acima) são, na verdade, as fôrmas usadas na confecção dos tijolos de adobe (veja detalhes no próximo tema). E não pense que elas foram aposentadas de vez: basta alguém precisar de um empréstimo para a duplinha voltar à ativa! - A mesa de refeições (1,80 x 1 x 0,80 m*) e os banquinhos (31 x 33 x 45 cm) foram comprados prontos, mas são de peroba-rosa de demolição. Da Vilarte, custaram, respectivamente, R$ 1 190 e R$ 190 cada. - Como os tons terrosos formam a base da ambientação, pude brincar com cores alegres nos acessórios, a exemplo da colcha (Mandala, Etna, R$ 169,90) e do panô indiano - presente da minha irmã -, que enfeita a entrada do dormitório.
Aproveitar o solo do próprio terreno para fazer tijolos artesanais era comum no período colonial. Hoje, é uma bela maneira de tornar a construção sustentável, pois elimina o impacto ambiental gerado pelo transporte do material da fábrica à obra. - A receita do adobe consiste em juntar terra e palha em proporções semelhantes, acrescentando água e amassando a mistura até que ela se torne moldável - essa tarefa é, tradicionalmente, realizada com os pés. - Depois de pronta, a massa é colocada em moldes, onde adquire o desenho dos blocos. Desenformadas, as peças são postas à sombra para secar naturalmente, sem a necessidade da queima em fornos, que prejudica o meio ambiente. - Argamassa e reboco também foram feitos à base de terra crua - outra possibilidade seria dispensar o segundo, deixando os tijolos à vista. - Como acabamento, a parede ganhou duas demãos de cal para pintura, em uma mistura que ainda leva água e cola branca. E, somente do lado externo, recebeu a cobertura de um hidrorrepelente para proteger da umidade.
Veja mais em: http://planetasustentavel.abril.com.br/noticia/casa/em-casa-parede-uma-historia-para-contar-790683.shtml